Tenho medo.
Faz muito tempo que vivo sozinha aqui. Um lugar vazio, em que não tenho nada para fazer. Esqueci até mesmo o som da minha voz. Depois de acordar venho me sentar aqui. Sempre no mesmo lugar. E fito o nada mais bonito que já vi.
O nada preenche tudo o que conheço. Sei que já vivi coisas coloridas, mas agora estou imersa num mundo preto, onde nem sequer o branco existe. Ditei o dia e a noite, na esperança de que, enganando a mim mesma, eu pudesse criar a luz.
Então me sento aqui. E fito o nada mais bonito que já vi. Só aqui o vento traz a areia de um jeito que vejo a silhueta de uma pessoa vindo. Sei que não é verdade, mas gosto de mentir para mim mesma na maioria do tempo.
Tenho medo.
Não da solidão porque já me acostumei a ela. Na verdade, acho que ela é a minha companheira mais fiel. Sem ela eu não saberia trilhar meu caminho; e daí o meu medo.
Tenho medo de a silhueta um dia virar uma pessoa. E se houver mais alguém nesse lugar? Eu já não sei falar, e a minha capacidade de comunicação deve ser nula. O vazio é o meu conforto.
Por muito tempo quis que isso fosse rompido, que eu tivesse alguém com quem pudesse compartilhar o que faço e o que penso. Mas não há nada para fazer ou pensar. Acho que a mesmice culminaria no término. E então eu ficaria só novamente, mas muito mais vazia que agora.
Parou de ventar. Não há mais a silhueta.
Acho que o dia já acabou. É noite; é sempre noite.